domingo, 26 de julho de 2009

E estamos conversados

Eu não acho mais graça nenhuma nesse ruído constante
que fazem as falas das pessoas falando, cochichando e reclamando,
que eles querem mesmo é reclamar,
como uma risada na minha orelha, ou como uma abelha, ou qualquer outra coisa pentelha,
sobre as vidas alheias, ou como elas são feias,
ou como estão cheias de tanto esconderem segredos
que todo mundo já sabe, ou se não sabe desconfia
Eu não vou mais ficar ouvindo distraído eles falarem deles e do que eles fariam se fosse com eles
e o que eles não fazem de jeito nenhum, como se interessasse a qualquer um.
Eles são: as pessoas, todas as pessoas, fora os mudos.
Se eles querem falar de mim, de nós, de nós dois,
falem longe da minha janela por favor, se for para falar do meu amor.
Eu agora só escuto rádio, vitrola, gravador.
Campainha, telefone, secretária eletrônica eu não ouço nunca mais, pelo menos por enquanto.
Quem quiser papo comigo tem que calar a boca enquanto eu fecho o bico.
E estamos conversados.

(Arnaldo Antunes)

quarta-feira, 8 de julho de 2009

O Estrangeiro

A quem você ama mais, homem enigmático, me diga: seu pai, sua mãe, sua irmã ou seu irmão?
- Não tenho pai, nem mãe, nem irmã, nem irmão.
- Seus amigos?
- O senhir está utilizando uma palavra cujo sentido para mim permanece até hoje desconhecido.
- Sua pátria?
- Ignoro sob qual latitude está situada.
- A beleza?
- Eu a amaria com prazer, deusa e imortal.
- O ouro?
- Eu o odeio como o senhor odeia a Deus.
- Ei! O que é então que você ama, extraordinário estrangeiro?
- Amo as nuvens... as nuvens que passam... lá ... lá adiante... as maravilhosas nuvens!

(Charles Baudelaire)

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? Voltei
Os fantasmas sempre voltam

sexta-feira, 29 de maio de 2009

terça-feira, 5 de maio de 2009

A má consciência burguesa - O machismo

Façamos a revolução! Temos que mudar o mundo! Mas não a nossa própria vida...



"- Não - disse Winifred - não fuja assim do assunto não. Francisca irá ao Xingu com grande prazer. Mas antigamente você estava de acordo em ir passar a lua-de-mel na Europa. Muito bem. Um belo dia você lê não sei que história sobre o Centro Geográfico do Brasil e resolve ir ao Xingu. A partir daí, sem consultar Francisca, você resolve que o melhor tempo de folga para ir ao Xingu é a lua-de-mel. O que eu critico é esse pouco caso, Levindo, essa maneira de agir como se só você contasse.

- Pois escutem. Eu estou resolvido a ir dentro de pouco tempo ao interior do Nordeste inteiro, com o Januário. Deixo Francisca, durante esse tempo, ir à Europa com o pai. Estão satisfeitos?

- Deixo - disse Winifred - deixo Francisca.

- Ué - disse Levindo - O que é que tem dizer deixo?

- Em primeiro lugar me diga: você perguntou a Francisca se ela quer ir à Europa agora ou se preferiria acompanhar você e Januário?

- Ah - disse Levindo - vocês também são de morte!

- Não, Levindo - disse Leslie - A Winifred não está implicando com você. Ela critica uma atitude sua, uma atitude brasileira em relação à mulher. [...]

- Em resumo, Levindo, sua revolução não inclui as mulheres. Você nunca menciona as mulheres no seu esquema. Ou digamos que inclui as mulheres. Mas não inclui a sua mulher, inclui?

Levindo se encolerizou.

- Ora, Winifred, pergunte a Francisca se ela quer marchar ao meu lado nos campos. Garanto que ela não quer."

(trecho de Quarup, de Antonio Callado)

terça-feira, 28 de abril de 2009

Demolição

"cola lá, leva umas ferramentas
que eu chamo um multirão
pra reformar nossa relação"

glauco martins

Eu não quero ser um estereótipo!

Eu não quero ser um estereótipo! Um tipo estéril. Que não gera nada além do que a fôrma o limitou. Embalagem e conteúdo que se confundem. Eu quero ser um imprevisto improvável.